25 janeiro, 2010

Sem vocabulário

por Marcos Soares

Amigos, semana passada teve início a temporada 2010 do futebol nacional. Os craques da bola já voltaram de suas férias e depois das pré-temporadas de seus clubes, preparando-se para mais uma maratona de campeonatos, torneios e jogos, a pelota voltou a rolar. Juntamente com retorno aos gramados, recomeçam as entrevistas. Desde os canais locais até os programas em rede nacional, seremos mais uma vez expostos a um “riquíssimo e altamente elaborado” vocabulário, que nos faz pensar qual é a incongruência que existe entre jogar futebol e articular até duas frases com o mínimo de conteúdo. Desde a hora em que a bola rolar até o último dia de campeonato, lá por perto de dezembro, ouviremos centenas, milhares de vezes expressões do tipo:

“Nosso time está focado.” (com as suas evidentes variantes “estou focado somente nesse jogo”, “o importante é entrar focado desde o primeiro minuto” ou “não estou pensando em propostas, estou focado somente em ajudar meu time”).

“Com certeza, com certeza, com certeza!” (esta não tem variações; apenas uma repetição infinita).

“Comigo não vai deixar de ser diferente” (nunca entendi bem o que isto significa)

“Vamos fazer o que o professor mandar.” (ah, se assim fosse. Pelo menos se o “professor” fosse de Língua Portuguesa...)

“É só manter a mesma pegada.”

“O importante são os três pontos.”

“Até porque...” (esta é mais característica no Rio de Janeiro)

Esteja certo de que o repertório não vai muito além disso. Parece que os jogadores são treinados para repetir a mesma coisa. Deve ter alguma lei que impeça um astro do futebol de se manifestar com outras palavras ou com um pensamento minimamente inteligente. Será que eles ficariam suspensos pelo STJD se mudarem os jargões? Será que faz parte das exigências de contrato? Não sei. Sei mesmo que esta é uma das coisas que me irritam no futebol. Eu, que pelo menos de longe acompanho um pouco deste esporte, fico desanimando ao ouvir as entrevistas nos intervalos e ao final dos jogos. Na verdade, não é preciso perguntar nada a ninguém. Todo mundo já sabe o que vai ouvir, do goleiro ao ponta esquerda. É a mesma ladainha, as mesmas frases feitas. É só ligar a fita do que disseram nos últimos 10 anos, não precisa fazer novas entrevistas.

Quando isso acontece no futebol, ainda nos sobra uma simples opção: desligar a TV ou o rádio ou mudar de canal ou estação. Mas e quando o mesmo acontece na igreja? Afinal, quem não conhece ou nunca ouviu crentes que tem a mesma mania dos jogadores de futebol? Nunca percebeu (talvez até porque você seja um deles) que existem cristãos cujo vocabulário “evangélico” já está tão padronizado, tão massificado, tão copiado, que eles nem pensam mais para falar, uma vez que falam sempre a mesma coisa? É a respeito disso que Jesus alertou no Sermão do Monte, quando disse que quando orarmos não deveríamos usar de “vãs repetições”, porque isso caracteriza aqueles gentios que, não tendo um relacionamento pessoal com Deus, só conseguem se dirigir a Ele utilizando-se de uma conversa normal, precisam repetir as frases ou expressões que ouviram outras pessoas usarem. Mesmo que elas não façam sentido algum para quem as emite. Já falei sobre isso algumas vezes nesta coluna.

Seja numa oração, numa conversa, numa mensagem, numa aula de escola dominical, num grupo pequeno, eles tem sempre a mesma frase, as mesmas expressões, os mesmos trejeitos, os mesmos assuntos. Aqui, no lugar do “com certeza” entra o “Oh! Glória”, o “Que benção”, o “Nosso Deus e Amado Pai”, o “Toma posse, meu irmão”, o “Tá amarrado”, o “Não está no tempo de Deus"; para citar alguns. Alguns são mais sofisticados e fazem as repetições em línguas originais. É um tal de “koinonia”, “shekinah”, “kairós”. A gente fala em crentês. Temos uma linguagem de gueto, de símbolos, de códigos que só os iniciados conseguem entender. Alguns ainda tem coragem de colar frases desse tipo nos vidros dos carros. Pintam na parede de seus estabelecimentos comerciais.

Mas há um aspecto pior do que a questão da comunicação com os que são de fora. Pior porque nem mesmo aos “iniciados” estas expressões fazem sentido. Não existe coisa mais triste do que uma pessoa dizer coisas certas e excelentes sobre Deus e nosso relacionamento com ele, mas que não expressem a realidade de nossa experiência. Meu pai dizia que os hinos e cânticos fazem muita gente mentirosa a cada fim de semana, porque muita gente que os entoa está tão longe daquelas palavras quanto se possa imaginar.

O salmista fez uma oração inteligente e interessante: “que as palavras dos meus lábios e o meditar do meu coração sejam agradáveis na tua presença, Senhor, rocha minha e redentor meu” (Salmo 19:14). Muito legal. Palavras agradáveis a Deus não são as politicamente corretas, as socialmente aceitas ou as eclesiasticamente consagradas. São as palavras que, embora possam ser simples como as de uma criança, sejam transparentes e verdadeiras, expressando aquilo que realmente pensamos e vivemos sobre Deus.


Pensando bem:

Com certeza, se você estiver focado em fazer o que o professor mandar, vai ganhar os três pontos, até porque não vai deixar de ser diferente. Com certeza!




*** 


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2 comentários:

Dani disse...

Como diria a pastora Márcia: "Fala, Jesus"...

Realmente, 'que as palavras dos meus lábios e o meditar do meu coração sejam agradáveis na tua presença, Senhor'. Amém.

Luciano disse...

Duda
Cara o Dunga?
O Dunga é chato, mal humorado, mas fala bem!
Acho que poderíamos colocar a foto do Luxemburgo ai, a dele sim combina mais com o texto.
Rs