por Ricardo Gondim
Quando a saudade aperta sem dizer suas razões, volto ao telhado da casa da vovó. Com pouco mais de 11 anos eu precisava fugir de um lar socado de gente. Subia os três metros do muro, agarrava-me à eira da casa e escalava minha cordilheira, o lugar de meu absoluto recolhimento. Sentava nas telhas de barro e por duas horas, que pareciam séculos, mirava o infinito. Às vezes me dá vontade de voltar lá, sentar no pináculo da catedral erguida por um pré-adolescente, cujo teto era o próprio céu, e ficar lembrando como aquela solitude representava um pedacinho da felicidade.
O sol opressivo grelhava a pele. O horizonte se limitava ao fundo do quintal. Mas o céu, antecâmara do infinito, se coloria com as lágrimas de minha inquietação pueril. O velho bangalô onde vivíamos tempos difíceis já foi esquartejado, pedra por pedra. Em algum monturo deve ter sobrado só uma telha com os sulcos carvados pelas gotas salgadas do resguardo existencial que me poupou da loucura.
Ainda consigo perceber as antigas melancolias, quase embotadas por anos de ativismo. Lembro de que eu sonhava viajar para longe; longe era qualquer lugar desconhecido. Querer partir mostrava sede de alguma coisa; prenúncio de um eterno suplício, que me induziria a repetir na vida adulta: “Sou como a corça que suspira por correntes de água...”
No velho telhado sussurrei minhas primeiras preces. Ali o Eterno contemplou um menino em horas intermináveis de idealismo, introspecção, amor e poesia. O menino, que ainda se parece comigo, transformava seu desterro em refrigério. Na cumeeira, as calhas convergiam em forma de cruz e eu, deitado, braços estendidos, abraçava o convite da solidão. Solidão construtiva, que sua sangue; pacífica, mas que atormenta.
Luto para que os muitos barulhos não te destruam, telhado amigo. Semelhante a ti, já tentaram me deitar abaixo, porém persistem as marcas de nosso deserto suspenso, que me deixava pertinho da Eternidade. Devo a ti poder repetir as palavras do poeta: “O tempo passa e junto passam os amigos, mas as memórias são para sempre”.
Na lancinante tarefa de viver, continuamos amigos. Telhado amigo, tu permaneces única testemunha das inquietudes de um homem que se sentia asfixiado em salas lotadas e se refazia com o cicio da bruma.
Soli Deo Gloria
O sol opressivo grelhava a pele. O horizonte se limitava ao fundo do quintal. Mas o céu, antecâmara do infinito, se coloria com as lágrimas de minha inquietação pueril. O velho bangalô onde vivíamos tempos difíceis já foi esquartejado, pedra por pedra. Em algum monturo deve ter sobrado só uma telha com os sulcos carvados pelas gotas salgadas do resguardo existencial que me poupou da loucura.
Ainda consigo perceber as antigas melancolias, quase embotadas por anos de ativismo. Lembro de que eu sonhava viajar para longe; longe era qualquer lugar desconhecido. Querer partir mostrava sede de alguma coisa; prenúncio de um eterno suplício, que me induziria a repetir na vida adulta: “Sou como a corça que suspira por correntes de água...”
No velho telhado sussurrei minhas primeiras preces. Ali o Eterno contemplou um menino em horas intermináveis de idealismo, introspecção, amor e poesia. O menino, que ainda se parece comigo, transformava seu desterro em refrigério. Na cumeeira, as calhas convergiam em forma de cruz e eu, deitado, braços estendidos, abraçava o convite da solidão. Solidão construtiva, que sua sangue; pacífica, mas que atormenta.
Luto para que os muitos barulhos não te destruam, telhado amigo. Semelhante a ti, já tentaram me deitar abaixo, porém persistem as marcas de nosso deserto suspenso, que me deixava pertinho da Eternidade. Devo a ti poder repetir as palavras do poeta: “O tempo passa e junto passam os amigos, mas as memórias são para sempre”.
Na lancinante tarefa de viver, continuamos amigos. Telhado amigo, tu permaneces única testemunha das inquietudes de um homem que se sentia asfixiado em salas lotadas e se refazia com o cicio da bruma.
Soli Deo Gloria
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