01 fevereiro, 2010

Ensaio sobre a solidão

por Eduardo Gazola
Se eu soubesse desenhar e quisesse representar a solidão, desenharia um grande parque com muitas pessoas. Cada uma fazendo sua atividade, em seus grupos. Crianças brincando no parquinho, adultos em uma roda de chimarrão, desportistas correndo na pista, um casal de namorados em um dos bancos da praça trocando juras de amor. Enfim um local cheio de gente. No meio da multidão, talvez até mesmo naquela roda de chimarrão ou num grupo de jovens que estava ali na praça, eu colocaria um jovem sem destacá-lo ao grupo. Você talvez nem perceberia ele (vou usar 'ele' por ser genérico, sem definir masculino ou feminino) no meio dos demais.


Esse jovem estaria conversando com os demais, tentando se envolver com os semelhantes. Palavras aqui, palavras ali. Ora fala, ora aquieta-se.

Se você observar bem há em seu olhar uma busca desesperada por contato. Sim caro leitor, a pior solidão é aquela que é vivida em meio à muitos outros. Solidão não é necessariamente ausência de pessoas, muito pior ao indivíduo é não conseguir a simbiose em um grupo que estiver.

O solitário pode ser o cara que tem maior 'moral' em um determinado grupo, pode ser até mesmo um tagarela, na sua busca por contato, por apreço e por carinho.

A solidão poderia perfeitamente ser explicada por uma pessoa que mora no vigésimo andar do prédio de 40 andares, e que não conhece nenhum de seus vizinhos e nem é conhecida por nenhum deles. Essa pessoa é sozinha morando num universo de 500 pessoas.

Você pode observar a solidão no olhar do menino que não sabe jogar futebol, ou no artilheiro que não suporta perder um jogo.
Também pode ser vista no rosto assustado da menina que foi em um baile de carnaval com suas amigas para continuar na turma, mas que não via a hora de sair daquele lugar e voltar a estar 'sozinha' em seu quarto, longe da solidão da multidão.

Terrivelmente no fundo do olhar de uma criança, abusada por um parente ou um estranho, você verá sua solidão mesmo que brincando com outras crianças, mesmo sendo a mais 'feliz' de todas. A solidão pode ser bem camuflada.

Uma mulher que cria seus filhos sozinha, lutando contra todas as regras da sociedade, esforçando para sorrir em todas as fotos, correndo para provar a todos que ela pôde sim fazer tudo e ser feliz. Talvez no fundo de seus olhos, se você focar em sua alma, indisfarçavelmente verá a angustiante solidão teimando em parecer-se força.

Definitivamente você poderá observar a solidão dentro do templo de uma igreja, no rosto amargo mas sorridente que cumprimenta seus irmãos sob o apelo do ministro de louvor, rapidamente passa os olhos pelos seus e sem jeito volta ao seu lugar.

A pior de todas as solidões é aquela que vive cercada de pessoas mas sem que nenhuma delas penetre o mundo do solitário.
Se eu pudesse desenhar a solidão é assim que eu a retrataria, sem chamar sua atenção, no meio da multidão.

Essa talvez tenha sido a solidão de Cristo, quando em sua cruz, visto de todos foi abandonado até por aqueles que lhe eram mais íntimos. Quando o peso do meu pecado foi colocado sobre os ombros de Cristo e nem mais a presença do Pai ele pôde sentir, então sua solidão foi absoluta.

O mestre não estava escondido em uma gruta, gritando pelos profetas que não via. Não! Estava sozinho no meio da multidão, à vista de todos e todos o abandonaram. As palavras à Ele dirigidas eram de desprezo e humilhação. Como disse Isaias, dele não fizemos caso. Àquele nos deu todo amor, todo perdão, toda compreensão, lhe demos solidão e descaso.

Hoje pela Graça de Cristo, pelo mistério da cruz, não somos mais separados de Deus. O nosso pecado foi remido, a nossa dor curada, a ferida extirpada. Aonde estivermos, estaremos com Cristo e sua presença é real. O véu foi rasgado e a Graça proclamada.

Está consumado, disse Cristo. Não mais separados pelo pecado, mas separados do pecado, para santidade com o Santo.

Pense nisso.

2 comentários:

Luciano disse...

pensando um pouco...
tem razao
mas acompanho solitarios!
atendo gente solitaria todos os dias, e posso afirmar que a solidão sempre é fruto do egoísmo de alguem. O pior é que esse alguém mano quase sempre é o solitario.
Um grnde beijo.
Paz e comunidade!

Eduardo Gazola disse...

Obviamente que existem diversos motivos para a solidão.

Nesse último texto que eu postei, solitários, falo um pouco sobre as minhas perspectivas da solidão.

Existe o cara que se isolou, em busca de interesses próprios, ou sei lá ..., mas tb existe aquele que foi isolado, que por um caminho ou escolha acabou isolado sem ter a noção disso ...

A questão desse texto é que a maior solidão, das que nos cabem, é aquela que ninguém vê. Aquela em que rodeados de pessoas ainda estão sós.

Cristo já nos deu o consolador, e não precisamos mais ser sozinhos ...

Abração!